Por que não podemos mais conter nossos talentos no serviço público?

Cris Ferri
3 min readMay 31, 2021

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Este texto é para quem já pensou em ser um servidor híbrido.

Já há algum tempo temos visto a infeliz deterioração do serviço público. Muitas organizações evitam fazer novos concursos públicos, apenas para citar um exemplo, em face da crise econômica e a consequente redução de custos da área pública. No entanto, servidores têm-se aposentado a cada ano e sofremos com o baixa reposição de recursos humanos e o enfraquecimento das carreiras.

Por outro lado, contratações de serviços terceirizados pela administração pública vão de vento em popa, além da criação sempre crescente de cargos de livre nomeação política. Não obstante, a reforma administrativa em discussão no Congresso, que não foi construída com a participação de servidores, traz um saco enorme de maldades com potenciais efeitos destrutivos do serviço público. Bom, este artigo não vai tratar disso, mas de outros caminhos para servidores.

fonte: Gilberto Lima Jr., Correio Braziliense

Ao contrário da campanha negativa da mídia em relação a servidores públicos, vejo uma enorme massa de servidores competentes, comprometidos e dedicados. No entanto, penam com as mazelas seculares do serviço público no dia-a-dia: politicagem para todo lado, a convivência com colegas picaretas não punidos, a burocracia de procedimentos sem sentido impulsionada pela 'ditadura do controle' ineficaz, a falta de incentivos para posturas inovadoras e pró-ativas, e por aí vai.

Se você é um servidor ou servidora que não consegue se realizar na área pública, que tenta fazer seu trabalho, mas muita gente atrapalha, ou mesmo, seu trabalho na área pública não é o bastante para você, por qualquer outro motivo, você precisa considerar ser um servidor híbrido.

O que é um servidor híbrido? Aquele servidor que complementa seu tempo e dedicação ao serviço público com outros trabalhos externos.

Existem basicamente dois tipos de servidor híbrido. O primeiro é aquele que realiza trabalhos externos em áreas não relacionadas ao trabalho, como ter uma companhia de teatro enquanto é assessor de comunicação pública, ou especialista em políticas públicas no Ministério do Transporte e trabalha como pizzaiolo na pizzaria da esposa.

O segundo tipo é o servidor que aproveita os conhecimentos e experiências adquiridos na área pública para dar aulas, realizar consultorias e mentorias para alunos e organizações privadas interessadas no seu trabalho, apenas para citar algumas possibilidades. Neste caso, o servidor híbrido exerce sua vocação de maneira intensa e impacta mais pessoas.

No entanto, há alguns cuidados e alertas para que o servidor exerça essa dupla jornada de trabalho. A primeira de todas é a mais importante: não adianta querer tocar um trabalho externo se não faz o 'dever de casa', ou seja, exercer com efetividade e inovação suas funções na área pública.

Em seguida, o servidor precisa entender que deve obedecer aos impedimentos e conflitos de interesse. Há impedimentos gerais, prescritos em lei, como na 8.112/91, que proíbe o servidor de exercer o comércio e ocupar cargos executivos em empresas. Além disso, existem impedimentos específicos de algumas carreiras, a exemplo de servidores da Justiça que não podem exercer a advocacia.

Conflito de interesse implica numa avaliação para saber se o servidor está numa situação concreta de realização de algum trabalho externo que privilegie interessado privado em detrimento do interesse público. Uma situação bem típica de evidente conflito de interesse: o auditor-fiscal da Receita Federal que ministra um curso in-company para uma empresa objeto de fiscalização do seu órgão.

Há muito que se falar sobre o assunto, mas vejo como natural a realização profissional de colegas servidores que se dispõem a exercer suas vocações de maneira complementar à área pública. Melhor esse caminho do que aquele das frustrações contínuas e instabilidades intensas da área pública. Ser feliz no trabalho é fundamental para saúde e performance.

Desde que o servidor trabalhe com efetividade, inovação e ética na administração pública, não há problema em estender seus talentos para outros trabalhos. Afinal, poderá inclusive ser um profissional mais completo, com mais riqueza de experiência e conhecimento. E isso certamente reberverá de maneira positiva no seu trabalho na área pública. Além de deixá-lo mais feliz (e cansado, também).

Quer saber mais sobre o assunto, acompanhe meus vídeos e conteúdos no meu canal no Youtube (vídeo abaixo), no Instagram @cristianoferri e no meu grupo VIP do Telegram https://t.me/destravacarreira.

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Cris Ferri
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Written by Cris Ferri

Gestor e professor de inovação na área pública, curioso incansável, eterno inquieto, apreciador da boa cerveja e motorista de filhos.

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